Maira de 63 anos está sentada no seu sofá sóbrio. Seu vestido é âmbar e suas unhas são pretas. Seu cabelo curto e grisalho, seu óculos elegante no colo e seu batom discreto destoam da convulsão de lágrimas que irrompem de seus olhos. Elas são quentes e não é devido à iluminação montada em sua sala.
Anitta pensa em desligar a câmera.
Desculpa.
Tudo bem.
Não, desculpa. Vamo parar...
Não, não. Podemos continuar.
Certeza?
Sim.
Então, tá... Eae galera, tudo certo?
Rodando.
Tudo bem... Qualquer coisa é só dizer, tá?
Maira concorda com a cabeça afirmativamente.
Certo... Então, qual foi à última vez que você viu o Aylton?
Foi em 71. Ele me levou da faculdade para casa. Disse que ia numa reunião. Vi sua silhueta desaparecer no contraluz do fim de tarde. Era nossa despedida e eu não sabia. Lembro da calça sarja ocre, do jaco marrom por cima da camisa social branca, do maço de cigarro no bolso da camisa, dos sapatos pretos, do cabelo castanho penteado para o lado, do sorriso amarelo, do olhar verde acastanhado, do hálito amadeirado, do cheiro de livros, dos lábios suaves e... do beijo acolhedor. Faria de tudo para reviver essa lembrança desbotada, mas com uma única diferença, sem o chumbo, só com o amor.
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