Pular para o conteúdo principal

Manhã Escaldante


Nanda espera Leo na mesa da cozinha. Bebe um café quente vestida com seu roupão vermelho. Desvia o olhar das mãos que apertam a caneca para o relógio na parede. O ponteiro menor está no número oito e o maior no dez. Os olhos fundos revelam mais do que seu cansaço, são reflexos da angústia e frustração. Ainda não pregou as pálpebras e o café ajuda na tarefa de deixá-las abertas. 

Ouve as chaves na fechadura da porta. Apreensiva acompanha os passos que vão se aproximando. Leo entra na cozinha. Encara-a indiferente enquanto Nanda o evita olhando para baixo, para seus dedos delgados que nervosos apertam a caneca com mais intensidade. Ele pega a garrafa de café que está em cima da mesa, na pia pega um copo que seca no escorredor. Com o café fumegante sai mudo assim como entrou.

Ela ouve o ranger do couro do sofá e as vozes da televisão. Levanta-se e no quarto tira o roupão. Se olha no espelho. Ganhou uns pneuzinhos na cintura, mas continua maravilhosa. Toma um banho e escolhe um vestido que nunca mais usou. De verão, cinza, solto e cheio de flores. Em cima do guarda roupa pega sua antiga mala e deposita dentro dela as mudas que mais gosta.

Da cozinha ouve o ronco do marido e os balburdios da conversa entre Ana Maria Braga e Louro José. Debaixo da pia pega uma garrafa de dois litros e descalça, para evitar o ruído dos passos, caminha levemente até a sala. Ainda tomando cuidado ensopa o chão com o líquido inflamável. Busca a mala, a coloca no hall e pega a Veja em cima da mesa de centro. Queima a revista com seu isqueiro e antes de soltá-la no chão acende seu Lucky Strike com as chamas. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gatos & Exercícios

Enquanto faço abdominais minhas gatas me encaram. Posso ouvi-las: “O que você está fazendo, humano?” Cansado na segunda série de dez concordo com elas: “O que que eu tô fazendo?!”

Fofis

Wesley corre desesperado para casa. Envergando o corpo pra frente e contraindo as nádegas para segurar a vontade. Parece que quanto mais próximo mais ela aumenta. Chega esbaforido em casa e se apressa para o banheiro. Quase que não tem tempo de abaixar as calças. Haaaa. Sente-se aliviado. Que aperto. Ao olhar ao lado não vê o papel higiênico. Nem no armário da pia. Putz. Ô BIIIIIIAAAAH! BIIIIAAH! Bia grita. OIEE! Que foi?! Tá doido?! Meu, compra um papel ali no Juarez. Vim numa carreira só e não percebi que tinha acabado. Você quer dizer caganeira só, né?! Wesley se irrita. Anda logo menina. Tá bom, tá bom. No Juarez Bia decide qual marca de papel levar para casa. A que sua mãe sempre compra aparentemente acabou. Distraída olhando para a parte de cima da prateleira onde os papéis ficam ela tromba com Emily. Oi Em, tudo bem? Tudo sim e você? Também estou bem. E aí, o que procura? Vim comprar aquele papel de dupla camada, sabe? Fofinho e tal. Ah, sei, o Fofis, né? Isso. O que tem uns ur...

Lobo Solitário

Enzo caminha para a escola. Durante o trajeto passa por um bazar escolar pequeno, mas bem arrumado, prateleiras e objetos bem distribuídos pelo espaço, parece ser um local bem arejado e limpo. Um lugar que dá vontade de entrar. Nos fundos um balcão de vidro, sobre ele um computador e atrás do balcão um cara simples numa cadeira assistindo algo no PC. Ele aparenta ter uns vinte anos, talvez beirando os trinta. Barba por fazer e de boné. Fones no ouvido. Desligado do mundo. O professor passou um daqueles trabalhos horríveis para turma. Eles precisam desenhar um átomo, fazer uma espécie de cartaz para colar na sala. Enzo vai até o bazar que sempre lhe convida a entrar pra comprar uma cartolina. As cartolinas, os crepons e todos esses tipos de papéis que são desperdício de árvores estão enrolados e dentro de pequenas caixas de papelão que ficam numa prateleira atrás do balcão. Enzo entra e observa o lugar, o cheiro do estabelecimento é agradável, ele passa pelas prateleiras cheias de ...