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Fofis

Wesley corre desesperado para casa. Envergando o corpo pra frente e contraindo as nádegas para segurar a vontade. Parece que quanto mais próximo mais ela aumenta. Chega esbaforido em casa e se apressa para o banheiro. Quase que não tem tempo de abaixar as calças. Haaaa. Sente-se aliviado. Que aperto. Ao olhar ao lado não vê o papel higiênico. Nem no armário da pia. Putz. Ô BIIIIIIAAAAH! BIIIIAAH! Bia grita. OIEE! Que foi?! Tá doido?! Meu, compra um papel ali no Juarez. Vim numa carreira só e não percebi que tinha acabado. Você quer dizer caganeira só, né?! Wesley se irrita. Anda logo menina. Tá bom, tá bom. No Juarez Bia decide qual marca de papel levar para casa. A que sua mãe sempre compra aparentemente acabou. Distraída olhando para a parte de cima da prateleira onde os papéis ficam ela tromba com Emily. Oi Em, tudo bem? Tudo sim e você? Também estou bem. E aí, o que procura? Vim comprar aquele papel de dupla camada, sabe? Fofinho e tal. Ah, sei, o Fofis, né? Isso. O que tem uns ursinhos na embalagem que lembram os ursinhos carinhosos e tal. É, é, é esse mesmo. Mas aqui não tem... E você? Vi que você procura e procura... Ah, tô atrás de acetona para fazer minhas unhas, mas tô vendo que não tem também. Meu, o Juarez tá falindo, né? Não tem mais nada aqui. Olha as prateleiras vazias. Verdade. Fiquei sabendo que ele quer passar o ponto, parece. Mas mesmo assim, passa bonitinho. Bora ali no Baratão, lá deve ter. Bora. No caminho do mercado Em coloca Bia a par do seu rolo com Binho. Mas que história é essa, louca? Foi meu, já tem duas semanas que tamo ficando. E aí? E aí o quê? Já transaram? E o pinto dele? Ah, é uma lindeza, mas depois eu te conto mais. Viu, aquele amigo dele, o branquinho Swag, sabe? Sei, mas não lembro o nome. Então, ele tá a fim de você. Sério? Sim, e aí? Tem condição? Ô se tem. As novidades alegram Bia, parece que tudo está indo de barlavento, quando chegam ao mercado os ventos mudam. Cara, aqui também não tem o papel. E nem acetona, completa Em. Mano, bora lá no Marquise. Não é possível que lá não tenha. Sim, sim. O Marquise fica a duas quadras de onde ela estão. Bia apressa o passo e Em acompanha o ritmo. Ela lembrou-se do irmão no banheiro. Numa das ruas que cortam a principal saem Binho e o seu amigo Swag. Binho cumprimenta Em com um selinho e apresenta o amigo a Bia. O Swag apesar de lindo cora ao se aproximar de Bia. Onde cês vão com essa pressa? Vamo ali no Marquise, bora com nós? Simbora, bora Rômulo? Opa. O encontro faz Bia esquecer-se do irmão. Então, seu nome é Rômulo? Isso. E o seu é Bia, certo? Sim. Ela esboça um sorriso falso. Que idiota, pensa. Rômulo parece desconfortável também. Posso te chamar de Swag? Ele ri. Se você prefere... Mas por quê? Não precisa perguntar, né? Não, não sou swag. Sempre me vesti assim, antes de virar modinha, até. Ah é? É... É que sempre gostei de hip hop, então acho que sempre foi assim, até eu ter consciência, sei lá. A sua timidez tem charme e Bia se interessa pelo rapaz. Bia, vamo na pracinha com eles rapidinho. De repente Em mudou de planos. Bia até se esqueceu do que ia fazer e topa a sugestão da amiga. Vamo. Posso te chamar então de Rô? Ele ri novamente e diz que sim. No banco da praça eles conversam sobre tudo, vida, escola, livros, filmes, música, tudo que os possa aproximar. Bia coincidentemente também curte rap e os dois engatam a trocar ideia sobre Racionais, RZO, Sabotagem, Expressão Ativa, Kamau, Criolo, Ogi, Síntese. Mas viu, acho que curto mais os americanos. Sério? Eu acho sem sentido, não entendo nada. Nem 2Pac, Dr. Dre, Eazy E, Notorius? Já ouvi algumas, mas sei lá. Ele pega o celular e solta Ab-Soul. Soulo Ho3. E esse? Ela ouve uma voz feminina, na verdade, a voz é mais eletrônica do que tudo, introduzindo a música, depois o beat entra junto com Ab-Soul que fala versos em inglês, a música parece interessante, Jhene Aiko volta com sua voz sem filtros fazendo uma espécie de dueto com Ab que começa a cantar com mais empolgação. Ela também se empolga. Nossa. Legal. Acho que preciso prestar mais atenção nesses caras. Esse cara é novo. Qualquer dia eu posso passar na sua casa e te passar ele e outros caras pra você ouvir, que tal? É mesmo? Maliciosamente. É. Ele responde. Bia se aproxima de Rô e os dois comprimem os lábios. Enquanto se beijam, ela não sabe o motivo, pois estava curtindo, o irmão volta à cabeça. Meu Deus! Que foi? Não gostou? Gostou? Não, não, não é você. Eu tenho que ir. Vá lá em casa depois, pegue meu whats com a Em. Tchau, tchau. Tá, mas pera... Rômulo dá pause na música com um sorriso no rosto. Bia corre desesperada até o Marquise. Merda, Wesley vai me matar. A fila do mercado está enorme, umas vinte pessoas na sua frente. Droga. Aqui devia ter aqueles caixas para poucos produtos. A sua perna balança sem parar e os seus olhos volta e meia retornam para o relógio na parede do mercado. Finalmente sua vez. Ela tem cinco reais, o papel é quatro e cinquenta, ela entrega o dinheiro e sai em debandada. Ei moça! Seu troco! Não precisa, não precisa. Nem sacola ela pega. Volta correndo para casa como uma louca desmiolada. As pessoas na rua acham a cena cômica. Uma garota com um pacote de papel higiênico nas mãos a toda velocidade. Alguém precisa muito se aliviar. Em outra hora ela até pensaria no mico que está pagando, mas agora a única coisa que vem em sua mente é o irmão todo esse tempo sentado na privada. Suada e descabelada ela chega em casa. Passa pela garagem como uma bala, atropelando o próprio pai que abre a porta do carro. A mãe se assusta com o vulto que passa pela sala em direção ao banheiro. Meu Deus, menina! Pra que isso?! Wesley! Wesley! O banheiro está com a porta aberta e a luz apagada. Oxê. Cadê ele? O pai volta para casa e pega o papel das mãos dela e corre para o banheiro. De lá dentro grita. Ele tomou banho. Dependesse de você ficaria plantado aqui durante a noite toda. Como assim tomou banho? Tomou banho minha filha. Esperava o que? Que ele se limpasse com sabugo? Como fazia eu e sua mãe no Norte. Credo pai. E cadê ele? Saiu. Como assim saiu? Deixa de conversa, Bia. Me deixa em paz aqui. Tá bom. Ela sobe para o quarto exausta. Se joga na cama morta. Liga o ventilador do criado mudo ao lado da cama e fica assim se refrescando durante uns bons minutos. Quase caindo no sono ela é despertada pelo celular que vibra. Número desconhecido. Hey, gostei de você. Segura essa. Ela sorri com a mensagem e baixa a música. Pega num soninho gostoso com Bohemian Grove.

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