Eu quero um jazz. Mas não qualquer jazz. Quero um jazz livre, solto, desenfreado, arrebatador, virtuoso, catártico, negro e africano. Os brancos transformaram a música erudita em mero formalismo rígido e sem vida, coube aos negros devolvê-la a pulsação através da criação e do improviso. Além de aprisionar a música, os brancos também aprisionaram os negros com seus grilhões visíveis e invisíveis, mas apesar disso, eles não conseguiram aprisionar a alma e o espírito, partes que eram incapazes de ver, além da cor da pele e dos traços físicos. O jazz nasce do confronto e não do encontro com tradições europeias, assim como a liberdade, a cidadania e a igualdade nasceram também pelo confronto com a segregação e o preconceito. Jazz é o confronto com a estrutura, com a melodia, com a tonalidade, com a concepção rítmica ou métrica, com a unidade, com a sociedade e com a posição que esta reserva para os seus criadores. O jazz é resistência, é contracultura, é em sua essência, negro. Das working songs que ritmavam o penoso trabalho nas plantações de algodão, passando pelo gospel e o spiritual que possibilitaram chamar os cultos cristãos de seus, do blues ligado a miserável existência até chegar ao ragtime e sua falta de unidade e ritmos africanos, o jazz enfim surgiu com seu dixieland, swing, middle, bebop, cool, revival, modal, free, fusion. Toda música negra é a linguagem de um povo arrancado de sua terra para ter sua humanidade negada na terra de outrem, seja o soul, o rhythm and blues, o samba, o hip-hop, todos possuem em seu âmago a essência da sofisticação de Duke Ellington, da virtuosidade de Charlie Parker, da polirritmia de Max Roach, da ferocidade de Charles Mingus, da textura de Sonny Rollins, do misticismo de John Coltrane, do experimentalismo de Ornette Coleman, da versatilidade de Miles Davis e Herbie Hancock, em suma, liberdade, a essência de toda música negra, hoje e sempre.
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